Se “o problema do outro é problema do outro”, esse texto chega exatamente para debater a compaixão.
Tenho observado a cultura do ressentimento. Como crianças, esperamos demais dos outros e das situações e pouco fazemos além de reclamar e de nos considerar vítimas.
Em vez de insistir no “eu mereço…” como lamentação, deveríamos aprender a nos envolver também. Arregaçar as mangas não só para exigir, manifestar, reclamar, apontar, mas também para formar uma rede de pessoas resolutivas, dispostas a melhorar não o mundo, mas o pedaço a que pertence. Sabe, tem muita coisa piorando a vida da gente, mas fazer coro com aquilo que atrapalha, não resolve.
Gastamos tempo e energia consideráveis com o objetivo de chamar a atenção das pessoas em geral – até mesmo daquelas que nos interessam pouco.
Vivenciei fato curioso nas últimas semanas. Uma aluna alertada por sua professora de que deveria recorrer à psicoterapia para avaliar uma premente depressão e casos de formação reativa, revelou-se um novo ser nos dias que se sucederam. Não obstante achar que a Fênix não passa temporada nas cinzas para renascer, reconheceu nas palavras humildes da mestre, energia para sustentar sua vaidade.
Vivemos nos comparando e quando nos sentimos menos do que “outros”, imediatamente nos sentimos humilhados. Fugimos dessa humilhação porque é uma das maiores dores que podemos sentir.
Provavelmente, como parte ilustrativa do tema do texto e tentando não julgar, a estudante sentiu-se diminuída, ao invés de entender que havia um verdadeiro interesse da professora em fazer com que sua aprendiz buscasse um tratamento. Mas a moça surtou. Arrumou um meio de persuadir outras colegas a se revoltarem, repassou e-mails, juntou-se em grupos, fomentou fofocas, criou discórdias. Ela continua sem tratamento e conseguiu alguns seguidores na escola que frequenta. Bem, semelhante atrai semelhante.
Numa sociedade competitiva e estimuladora da ambição, praticamente todos nós nos sentimos por baixo (humilhados) em algum aspecto que julgamos “essencial”. Somos todos movidos pela competição e estamos todos frustrados porque achamos que a cota de privilégios, de reconhecimento, que recebemos é insuficiente.
Nos tornamos rancorosos, amargurados e com sede de vingança: usamos nossas facilidades com o intuito de nos vingarmos daqueles que nos humilham com as “qualidades” que não possuímos. O fenômeno é quase universal: todo o mundo fica com raiva de todo o mundo. Todos aqueles que sentem a humilhação, tratam de se vingar exibindo seus dotes.
Mas atenção: ao tratarmos isso como inevitável, teremos que constatar que tais processos, que estavam a serviço do aprimoramento e perpetuação da nossa espécie, agora é o esperado, é o resultado da ação, é o que se conclui da evolução.
Acredito ser essencial aprofundarmos a reflexão acerca da vaidade e da competição, da ênfase que temos dado às qualidades excepcionais que só uns poucos podem ter e de quanto tudo isso é, de fato, inexorável. Um elemento básico para alcançarmos alguma serenidade consiste em nos livrarmos das mágoas e ressentimentos que povoam nossa subjetividade.
Nem sempre é fácil reconhecer os fatos que nos provocaram enormes ressentimentos: muitos foram causados por nossos amigos mais queridos. Qualquer pequeno avanço nesse estado já garante um grande alívio.
(Texto livre, adaptado de reflexões pessoais, artigos sem divulgação do autor e de obras de Flávio Gikovate)
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Mas nem sempre é fácil
Livrarmos do ressentimento!!
Embora seja do outro,uma calúnia,doi pra caramba!!
Precisava ler isso hoje...estou exatamente passando por uma situação dessas e de alguém muito próximo,que infelizmente tenho que ver com frequência e estava deixando por vaidade a raiva e mágoa tomarem conta,não tenho vontade nem de cumprimentar,mas sei que isso só fará mal pra mim...
Meu Deus!! estou passando a mesma coisa!! nossa!!!
Texto que descreve exatamente as pessoas que vivem magoas...vivo isso!!!Não podemos nos responsabilizar pelos atos dos outros...não trazer para dentro de nós essas grosserias que nos ferem tanto!Faço terapia e luto incansavelmente para me libertar das amarras da magoa!Obrigada pelo texto!
muito bom este texto!!!
Vivo isto constantemente.
A magoa esta plasmada gratuitamente mim. Eu vejo essa gente a serviço da magoa em todo redor, inteteressante è que o magoador encontra pessoas disponiveis a perpetuar o seu veneno em nossas almas. Ao sair de uma situaçao do genero tive trabalho para mim liberar desse mal porche a situacao insiste em nos acompanhar. O melhor e esquecer. Nao tocar no assunto. Trocar de endereço. Nao deixar rastos para os maos de plantao.
Excelente texto. Gostaria de me aprofundar nos temas: ressentimento, competição e vaidade. Qual obra você me indicaria do Flavio Gikovate?